6. A FÓRMULA PRONTA

     Era vez de Beterraba trabalhar. Ela pegou a taça e virou o líquido de uma vez. Porém, não engoliu. Ficou com ele na boca, fez bochecho, gargarejo, jogou para um lado e para o outro enquanto fazia olhar de mistério. Algo estava escondido. Ela repetiu os movimentos e nada. Frustrou-se. Pensou que seria mais simples. Todos olhavam para ela com apreensão. Beterraba ficou insegura, fez cara de dor e tristeza. Era problema dela e não estava dando conta.
     - Não posso cuspir de volta para a taça – pensou ela com seus botões.
    Resolveu então fazer o que todos fazemos quando não sabemos o que fazer: nada! Deixou o líquido paradinho dentro da boca e passou a observar o detalhe de uma rachadura na parede, bem à frente. Fazia um desenho estranho, uma linha craquelada que girava em torno de si mesma, formando algo parecido com um caracol. Aquilo lhe deu paz, acalmou o tum tum descontrolado que martelava o peito. Então, ela sentiu a língua formigar. Era bom de sentir, apavorava e dava prazer ao mesmo tempo, fazia cócegas.
     O que Beterraba não atentou foi ao fato de que o líquido transformava-se em outra coisa. Em vez de preencher toda boca, ele agora era um filete que rodeava a língua da gorduchinha. Tal processo durou instantes - até que Beterraba sentiu algo lhe apertar. De repente, ela abriu a boca e todos viram um anel dourado preso à língua!
     - Com licença – disse Zé. Ele colocou uma luva cirúrgica e, com a ponta dos dedos, retirou o anel. Ninguém se admirou de ver um troço daqueles surgir da boca de Beterraba. Estavam acostumados aos mais loucos reveses no laboratório de Margô, como no dia em que de dentro do ouvido de Celeste emergiu um porquinho-da-Índia falante que disse a todos “bom dia”.
     Zé, então, depositou o anel em uma caixinha de chumbo que retirou de dentro do bolso da calça. Fechou-a e contou até 23. Era o número mágico para aquela ocasião. Em seguida, ele abriu a caixa e – como se esperava – nada havia no interior. Margô não conteve o sorriso. Os outros entreolharam-se satisfeitos. Estava feito – e nem fora assim tão difícil.
     - Muito bem, meus queridos. É assim que fazemos. Eficiência é o nome de nossa equipe! – disse Margô, sem conter a empolgação do sucesso.
     Alguém, contudo, não estava animado assim. E esse alguém, no momento, estava ocupado em desinfetar uma privada.

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