9. TRABALHO REPROVADO

     - Assembleia geral! Assembleia geral! – berrou Margô.
     Celeste, Zé, Beterraba e Baldo deram um pulo de susto. Até mesmo Rimo abriu os olhos esbugalhados. Imediatamente, deixaram os afazeres de lado e concentraram-se na patroa. Ela deu uma das mãos a Sorondo e, tomando impulso, subiu na própria mesa. O velho mordomo ficou ao seu lado, com um aspecto muito grave.
     - Lá vem bucha! – disse Beterraba, não muito alto para que a doutora ouvisse, não muito baixo para que Rimo lhe evitasse um olhar de soslaio, por baixo das grandes pálpebras. Os outros estavam imóveis; Baldo mal respirava.
     - Meus amigos... – começou Margô, após inspirar demoradamente e encher o peito de ar - todos executaram um ótimo trabalho agora a pouco. Esta caixinha sobre minha mesa é uma das melhores coisas que criamos. Vocês sabem disso, vejo nos olhos de cada um a satisfação. Porém, recebi informações relevantes do nosso querido Sorondo e creio que o produto não atenderá a contento as necessidades do cliente.
     Olhos estatelados. Breve silêncio, rompido pela funcionária mais pavio curto.
    - Como não??? – questionou Celeste. Está tudo aí dentro! Quando o irmão daquele estúpido abrir esta caixa, coitado!, adeus paixão, adeus amor...
    Margô esperou pacientemente que Celeste finalizasse seu ponto de vista. Só depois voltou a inspirar profundamente, olhou direto nos olhos dela e contou.
      - Teremos de refazer.
     Rimo arregalou os olhos. Zé franziu a testa e balançou a cabeça em sinal negativo. Beterraba cruzou os braços, fez bico e desabou na cadeira. Baldo abriu os braços e Celeste não se conteve.
     - Margô! Não faz sentido! Foi um trabalho perfeito! As escalas foram cumpridas todas corretamente, as inversões de substância aconteceram nos momentos exatos, a separação, a deglutição, a mistura aleatória... Tudo direitinho! Trabalho em equipe, entendimento total entre a gente, dedicação a cada detalhe, cuidado para fazer o melhor... Onde está o problema?
     A doutora e Sorondo entreolharam-se. Os outros aguardavam uma resposta, que veio logo em seguida.
     - Minha querida, você tem toda razão quanto aos aspectos técnicos e ao talento de nossa equipe. Mas, foi justamente toda esta boa vontade que contaminou o produto.
     Zé, que só abria a boca quando era extremamente necessário, cansou-se da polêmica e fez um pedido – em tom de exigência. E foi atendido.
      - Explique logo esta história, Margô. Por favor.
     - Tem razão, meu caro... Chega de embromação. A explicação é simples. Como faremos uma fórmula antiamor usando como ingredientes a sabedoria, a dedicação, a habilidade, a presteza, a força de vontade, a união, a parceria - entre outras qualidades positivas naturalmente presentes em nossa equipe? Entendem? É um contrassenso que leva impureza a esta mercadoria... Os meios não foram adequados para o fim.
     Nisso, a campainha tocou. Um calafrio atravessou a espinha de todos no laboratório. Seria o homem do abatedouro?

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