3. A EQUIPE COMPLETA

     Na fileira de trás, atrás de Celeste, ficava a mesa de Ariobaldo, vulgo Baldo, o homem da lua. Tinha a pela azulada, olheiras que chegavam ao meio da bochecha, cabelos pretos lambidos. Estava sempre de calça e camiseta de mangas compridas, não importa se era chuva, se era sol. Bocejava sem parar e Margô às vezes não sabia se ele estava acordado ou realmente dormindo.
     Contrastando toda languidez, Baldo tinha sempre um sorriso no rosto. Além disso, carregava nos ombros a mascote Rimo, um passarinho preto do bico à última pena da cauda, não muito dado à comunicação e ao movimento. Estava a maior parte do tempo de olhos fechados, ereto. Parecia um defunto empalhado, mas, vez ou outra, via-se o peito inflar e murchar de acordo com a respiração.
     À tira colo, Baldo trazia sempre um cacho de uvas. De meia em meia hora, Rimo abria o bico e o dono lhe enfiava uma goela abaixo, causando um barulho estranho de coisa sendo deglutida que ambos, parece, achavam graça. No laboratório, era responsável por descobrir novas “sensações”. Era bom nisso e fazia-o com prazer e facilidade.
     À sua esquerda, por fim, sentava-se Beterraba. Bonachona, gorducha e popozuda, mal se cabia na cadeira: escorregava de um lado ao outro tentando equilibrar as partes que sobravam. Tinha as bochechas muito fofas e vermelhas, mais ainda porque exagerava na maquiagem. Fazia duas tranças que pendiam sobre os ombros. No braço esquerdo, tinha tatuada a frase “lindinha do papai”, em letras rocambólicas, pouco decifráveis. Fez em homenagem ao velho, depois que o homem acidentou-se e partiu.
     Tinha a voz grave, estrondosa, bem como a gargalhada que, quando bem dada, sacudia-lhe todas as banhas. Então, sentia falta de ar e precisava segurar em alguém para se equilibrar, coisa que não surtia muito efeito, pois mais de uma vez ela levou a si e ao outro ao chão. Além disso, era muito forte: abria um vidro de azeitonas usando apenas o polegar e o indicador e também adorava mastigar coisas, especialmente coisas vivas.
     Era especializada em números e cálculos e contas, mas Margô lhe pedia todos os dias que, na maior parte das vezes, desorganizasse as “sensações”.
     - Desorganizar? – perguntou Beterraba, quando soube suas obrigações.
     - É um trabalho nobre. Faça com carinho – resumiu Margô.
    Eram estes os responsáveis por fazer da doutora ruiva dos sapatos vermelhos a dona do laboratório mais procurado das redondezas (e com planos de expansão para outros mercados, inclusive o exterior!). Entraram todos no mesmo dia (Margô era supersticiosa), coisa de seis anos atrás, e de lá para cá já haviam contabilizado 4.352 brigas – nenhuma, por Deus, resultando em mortos ou ferimentos mais graves.
    Ah! Não podemos esquecer Sorondo, o mordomo, junto de Margô desde que ela fazia xixi na cama. Negro feito noite sem lua, os olhos bem abertos, a boca bem fechada: um sábio por definição. Por isso, era também o encarregado por cuidar da muita grana que entrava e da pouca grana que saía.

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